Cidade de Blumenau, Brasil

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quinta-feira, 1 de abril de 2010

O PRINCÍPIO DA ANTERIORIDADE NO DIREITO TRIBUTÁRIO

RESUMO
O presente trabalho trata do princípio da anterioridade, previsto no art. 150, III, “c”, da Constituição Federal, e tem por objetivo contribuir para a sua aplicação aos casos concretos, sem a pretensão de encerrar o debate.

Palavras-chaves: Constitucional; Tributário; Competência Tributária; Limitação ao Poder de Tributar; Princípio da Anterioridade; Anterioridade Nonagesimal.

INTRODUÇÃO
Dentre as restrições constitucionais, previstas no Sistema Constitucional Tributário e denominadas limitações ao poder de tributar, encontra-se a anterioridade. Inserida no art. 150, III, “b” e “c”, da CF/88, a anterioridade preceitua a vedação imposta à União, Estados, Distrito Federal e Município de cobrar de tributos: a) no mesmo exercício em que foram instituídos ou majorados; b) antes de decorridos noventa dias da publicação da lei que os instituiu ou majorou.

A anterioridade representa, assim, conformidade com o princípio da segurança jurídica, assentado no art. 5º., caput da CF/88. De fato, quis o legislador resguardar o contribuinte contra possíveis surpresas em relação a carga tributária a que se submete, erigindo em favor do mesmo uma garantia segundo a qual lhe concede tempo para se adaptar a uma nova situação, especialmente quando mais onerosa.
Roque Antônio Carrazza avaliza este entendimento ao ministrar que "é ele, ainda, que exige que o contribuinte se depare com regras tributárias claras, estáveis e seguras. E, mais do que isso: que tenha o conhecimento antecipado dos tributos que lhe serão exigidos ao longo do exercício financeiro, justamente para que possa planejar sua vida econômica."

Todavia, a redação do art. 150, III, “b” e “c”, da Constituição Federal vigente, que estabelece a anterioridade tributária e, ao mesmo tempo, identifica os dois modos de efetivação desse princípio, tem gerado algumas interpretações equivocadas, dando-se à norma alcance diverso do que a mesma permite.

O presente trabalho pretende contribuir para a compreensão do princípio da anterioridade e tributária previsto na Constituição Federal de 1988, com a redação dada pela Emenda Constitucional n. 42/03.

A EFETIVAÇÃO DA ANTERIORIDADE TRIBUTÁRIA
Na Constituição Federal de 1988, o princípio da anterioridade, também conhecido como “princípio da não-supresa tributária”, estava previsto apenas na alínea “b”, do inciso III, do art. 150.

Antes da Constituição Federal de 1988, de acordo com Gisele Rodrigues, “o Princípio da Anterioridade da lei fiscal somente foi introduzido no nosso ordenamento constitucional com a EC 18/65, não constou na Constituição de 1967, e retornou com a EC 1/69 e foi mantido na Constituição Federal de 1988. O Princípio da Anterioridade substituiu o Princípio da Anualidade Tributária, que exigia prévia autorização orçamentária para que pudesse ser cobrado em um exercício.”

Para o legislador constituinte, ao determinar que o poder tributante estava impedido de instituir ou aumentar imposto no mesmo exercício em que a respectiva lei foi publicada, transferindo sua eficácia para o primeiro dia do exercício seguinte, estava o mesmo resguardando suficientemente o contribuinte e, simultaneamente, atendendo a cláusula pétrea da segurança jurídica fixada no rol dos direitos e garantias individuais.

Roque Antônio Carrazza aduz que ”já na época em que a Carta Magna foi promulgada pelo poder constituinte originário, sustentávamos que o princípio da anterioridade exigia que a lei que cria ou aumenta um tributo, ao entrar em vigor, fique com sua eficácia suspensa, até o início do próximo exercício financeiro, quando, só então, incidirá, vale dizer, passará a irradiar todos os seus efeitos.”

A premissa da segurança jurídica, entretanto, mostrou-se ineficaz a partir do momento em que o poder tributante passou a editar normas tributárias relativas à instituição e majoração de tributos muito próximas do final do ano, quando não o fazia exatamente no seu último dia, como se constatou em diversas oportunidades. Esta metodologia fez cair por terra a premissa do princípio da anterioridade, que era dar tempo ao contribuinte para se adequar às novas regras tributárias, pois de forma alguma atendia o espírito do princípio da anterioridade.

Foi com a edição da Emenda Constitucional n. 42/03 (DOU de 31/12/03) que se procurou, entre outras medidas, dar plena eficácia ao princípio da anterioridade, com o restabelecimento do espírito com que havia sido incluído na Constituição Federal de 1988.

Assim, pela EC n. 42/03, foi modificada a redação do inciso III, do art. 150, da CF/88, inserindo-lhe a alínea “c”, nos seguintes termos:
Art. 150: Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: [...] III - cobrar tributos: [...] c) antes de decorridos noventa dias da data em que haja sido publicada a lei que os instituiu ou aumentou, observado o disposto na alínea b;”

Com o advento da EC n. 42/03, portanto, passaram a ser duas as anterioridades previstas na Constituição Federal: I) anterioridade genérica; e II) anterioridade nonagesimal (ou mitigada).

Ocorre que a aplicação da anterioridade de acordo com os dispositivos constitucionais mencionados pode causar alguma confusão entre os contribuintes, notadamente quanto ao momento em que se aplica a anterioridade nonagesimal.

Antes, porém, de se procurar a interpretação mais adequada do inciso III, letras “b” e “c”, do art. 150, há que se dizer que a norma admite inúmeras exceções, a teor do disposto no § 1º., do referido artigo e do constante nos arts.155, § 4º., IV, “a”, e 177, § 4º., I, “b”, ambos da CF/88, revelando que muitos tributos não se submetem a esta ou àquela anterioridade ou mesmo a ambas, numa espécie de imunidade em relação ao princípio.

Quanto a anterioridade pura e simples, aquela prevista na alínea “b”, do inciso III, do mencionado art. 150, a redação do dispositivo não deixa margem à duvida quanto ao se preceito (vide reprodução acima). Destarte, todos os tributos, evidentemente com exceção daqueles previstos no § 1º., do art. 150 e nos arts. 155, § 4º., IV, “a” e 177, § 4º., I, “b”, todos da Constituição Federal vigente, somente serão alterados ou instituídos efetivamente a partir do primeiro dia do ano seguinte ao da publicação da lei que promoveu a modificação ou criação do tributo. É dizer, se a União, no exercício de sua competência residual, instituir um novo imposto através de uma lei publicada em 10 de abril de 2006 ou em 03 de agosto de 2006, o mesmo somente será exigível a partir de 1º. de janeiro de 2007. Isto porque a norma insculpida no art. 150, III, “b”, veda a cobrança de um imposto novo ou majorado no decorrer do mesmo exercício financeiro em que tenha sido publica a respectiva lei.
Por seu turno, a anterioridade nonagesimal ou mitigada, prevista no art. 150, III, “c”, da CF/88, determina que a eficácia da lei que instituir tributo ou modificar tributo existente gerará seus efeitos desde que decorridos 90 (noventa) dias da publicação da norma, sem prejuízo do disposto na alínea “b” do mesmo dispositivo.

Portanto, em casos de instituição de tributos novos ou de majoração tributos pré-existentes, as 2 (duas) anterioridades deverão ser observadas.

Como já se disse, a premissa do princípio da anterioridade é a segurança jurídica plasmada nos direitos e garantias fundamentais de que trata o art. 5º., da CF/88 que, na criação ou majoração de tributo, consiste na eficácia da norma relativa à criação ou majoração do tributo no primeiro dia do ano seguinte ao que a lei tenha sido publicada e desde que decorridos 90 dias entre um e outro pelo menos.
Não é outro, a nosso sentir, o entendimento que se deve dar à interpretação dos preceitos vigentes nas alíneas “b” e “c”, do inciso III, do art. 150, da CF/88. Ao priorizar a segurança jurídica que busca conferir ao contribuinte tempo hábil para a conformação à nova carga tributária, a Constituição fixa um prazo mínimo de 90 (noventa) dias para a efetivação da norma que, conforme o caso, poderá se estender para além do primeiro dia do exercício seguinte ao da publicação da lei que aumentou a carga tributária pela inclusão de um novo tributo ou pela majoração dos já elencados constitucionalmente.

Em conseqüência, não parece adequada a tese segundo a qual a noventena deverá ser observada independentemente da anterioridade tributária, pela qual a norma tributária, quando atingida por esse princípio, no entra em vigor no exercício seguinte ao da sua publicação. De acordo com este pensamento uma norma tributária que majora o ISS publicada em 15/03/06, por exemplo, só entraria em vigor decorridos 90 (noventa) dias do próximo ano, ou seja, em 01/04/07.

Pensar dessa forma é dar ao dispositivo - art. 150, III, “c”, da CF/88 – o alcance que ele não tem. A redação do dispositivo não deixa margem à dúvida quando diz que a eficácia da norma se dará 90 dias após a publicação.

Veja-se que o dispositivo em comento fala em vedação à majoração ou instituição de tributo novo antes de decorridos 90 (noventa) dias, com observância da anuidade (art. 150, III, “b”, da CF/88). Portanto, não basta que a norma tenha sua eficácia prorrogada para o ano seguinte, pois é necessário que seja publicada com noventa dias, no mínimo, de antecedência à sua efetivação.

A aplicação conjunta de ambos os dispositivos – alíneas “b” e “c”, do inciso III, do art. 150, da CF/88 – conduz à irrefutável conclusão segundo a qual a lei que institui tributo novo ou majora tributo já existente tem que ser publicada no ano anterior àquele em que o novo tributo ou seu aumento será cobrado e, ao mesmo tempo, esta norma só produzirá seus efeitos depois de 90 (noventa) dias contados da sua publicação.

Como bem asseverou Victor Gomes (In Revista Consultor Jurídico, de 01/01/2005, diusponível em www.conjur.com.br/), a inserção da alínea “c” pela EC 42/03 ao elenco do art. 150, da CF/88, elimina uma prática lesiva ao contribuinte, pois “antes desta novidade, eram comuns leis que aumentavam tributos em 31 de dezembro, com aplicação já a partir de 1º de janeiro. Depois dela, porém, uma lei que aumenta tributos, publicada em 31 de dezembro, só tem efetividade 90 dias depois.”

Logo, se a norma tributária sujeita à anterioridade for publicada num prazo maior em relação ao exercício seguinte, o preceito da alínea “c” do mesmo dispositivo restará atendido e a norma poderá exercer seu ordenamento já a partir do primeiro dia do exercício seguinte ao da sua publicação.

CONSIDERAÇÃO FINAL
Desde que a norma tributária atenda simultaneamente as condições previstas nas alíneas “b” e “c”, do inciso III, do art. 150, da CF/88, a sua eficácia se dará já a partir do primeiro dia do exercício seguinte ao que tenha sido publicado, exceto para os casos previstos no § 1º. do mesmo artigo, cujo tratamento é diferenciado.
(Autor: Carlos Lange)
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REFERÊNCIAS
1. BALEEIRO, Aliomar; DERZI, Misabel Abreu Machado (atualizadora), Limitações Constitucionais ao Poder de Tributar. Rio de Janeiro:FORENSE, 7a. ed., 1999.
2. CARRAZZA, Roque Antônio. Curso de Direito Constitucional Tributário. São Paulo:MAHEIROS, 2001.
3. GOMES, Victor. IMPOSTO ESTADUAL: São Paulo não pode cobrar ICMS com alíquota de 18%. Disponível em www.conjur.com.br. Acesso 14/03/2006.
4. MARTINS, Ives Gandra da Silva. O Sistema Tributário na Constituição de 1988. São Paulo: SARAIVA, 3a edição, 1991.
5. RODRIGUES. Giselle. O Princípio da Anterioridade. Disponível em: www.justributario.com.br. Acesso: 14/03/2006.

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