Cidade de Blumenau, Brasil

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sexta-feira, 21 de janeiro de 2011

A DECADÊNCIA NO DIREITO TRIBUTÁRIO

No Direito Tributário, a decadência ostenta peculiaridades de relevo, sobretudo perante o instituto análogo do Direito Privado. Em geral, há um período em que, a despeito de já ser possível exercer o direito, o seu prazo não tem curso. Em certas hipóteses, o prazo inicia-se quando o direito ainda não pode ser exercido. E, em outras, chega a ser interrompido ou substituído por um novo prazo decadencial. Isso se deve à complexa (e nem sempre apropriada) regulação da decadência pelo Código Tributário Nacional – CTN.

Ante a multiplicidade de regras existentes e a controvérsia que paira sobre a interpretação de algumas delas, pretendemos fornecer, neste escrito, uma visão panorâmica das distintas situações concernentes à decadência do crédito tributário.

Nos tributos sujeitos a lançamento por declaração ou de ofício, a decadência do poder-dever de o Fisco formalizar o seu crédito é regulada pelo art. 173, inciso I, da codificação tributária, operando-se em cinco anos contados do “primeiro dia do exercício seguinte àquele em que o lançamento poderia ter sido efetuado”. Dessa forma, mesmo que o Fisco pudesse haver lançado o seu crédito, v.g., já em janeiro de 2008, o prazo decadencial somente começará a correr em 1º de janeiro de 2009, exaurindo-se no final de 2013. É fácil ver que o CTN se distancia da ratio do princípio da actio nata (de consociar o dies a quo do prazo com o surgimento da possibilidade de exercício do direito), pois determina a existência de um significativo lapso temporal em que, apesar de o Fisco poder (e dever) lançar o seu crédito, o prazo decadencial não flui.

Se antes do início do prazo suprarreferido houver alguma notificação ao contribuinte de medida destinada à apuração de eventual crédito, o prazo decadencial começará a contar da data dessa notificação (art. 173, parágrafo único), e não do exercício seguinte àquele em que o lançamento poderia ter sido efetuado. Exemplificando, se o lançamento pudesse ter sido realizado em janeiro de 2008 e o Fisco solicitou documentos ao contribuinte em 1º de julho desse mesmo ano, o prazo quinquenal terá início nessa data, e não em janeiro de 2009. Caso a notificação seja posterior ao início (e anterior ao final) desse prazo, restará interrompido o prazo de decadência, recomeçando a contar da data da notificação (nessa linha, vide STJ, 1ª Seção, REsp 766.050, j. em nov. 2007). Sendo a notificação posterior ao final do prazo do art. 173, I, obviamente não haverá como se falar em interrupção: a caducidade já haverá ocorrido.

A regra do art. 173, I, porém, não se aplica a inúmeros casos em que se impõe aos contribuintes a obrigação de efetuar o pagamento antecipado, sem qualquer procedimento antecedente do Fisco (art. 150, caput, do CTN). A este incumbe, no sistema do código, levar a cabo o lançamento por homologação, que em regra geral se perfectibiliza mediante a ficção da homologação tácita, dado não ser praxe do Fisco homologar expressamente os pagamentos realizados pelos contribuintes.

Na hipótese de lançamento por homologação, havendo declaração a menor e pagamento do valor declarado, a decadência do direito de se lançar de ofício a diferença entre o tributo informado e o devidotambém se opera em cinco anos, mas o curso do seu prazo já se inicia com a ocorrência do fato imponível (art. 150, § 4º). Aludimos à diferença em razão de não se operar a decadência dos valores informados pelo contribuinte, que já foram formalizados e serão, segundo o regramento do CTN, objeto de lançamento por homologação, expressa ou tácita.

Se houver declaração a menor e pagamento parcial do montante declarado, também se aplicará a regra do art. 150, § 4º, mas com a peculiaridade de que fluirão simultaneamente dois prazos para o Fisco. Um decadencial, para lançar de ofício o seu crédito quanto a eventuais valores não declarados; e outro prescricional, para cobrar a quantia declarada e não paga.

Tal concomitância de prazos ocorre, outrossim, na hipótese de declaração desacompanhada de pagamento. Porém, nessa situação, bem como na de omissão quanto à declaração e ao pagamento, a regra decadencial aplicável não será a do art. 150, § 4º (cinco anos do fato imponível), senão a do art. 173, I (cinco anos do primeiro dia do exercício seguinte àquele em que o lançamento poderia ter sido realizado), ante a inexistência de pagamento a ser homologado. Note-se que este artigo incide isoladamente: a antiga jurisprudência do STJ que aplicava essas regras cumulativamente para chegar a um prazo decadencial de dez anos (EREsp 466.779, jun. 2005) restou superada (vide o precedente supracitado).

Também se aplicará o art. 173, I, se houver dolo, fraude ou simulação nas informações prestadas pelo contribuinte com respeito a tributo sujeito a lançamento por homologação, em virtude da expressa ressalva do art. 150, § 4º.

Caso o lançamento, realizado dentro dos prazos suprarreferidos, porventura for anulado em razão de vício formal, um novo prazo decadencial iniciar-se-á na data em que a decisão anulatória tiver se tornado definitiva (art. 173, inciso II). Por exemplo, se um crédito derivado de fato imponível ocorrido em maio de 2000 foi lançado em dezembro de 2005, por ato que vier a ser anulado mediante decisão preclusa em 31 de julho de 2012, o prazo decadencial para se realizar um novo lançamento somente se iniciará em tal momento, ou seja, em 31 de julho de 2012. O Fisco poderá lançar, até meados de 2017, o crédito do tributo que deveria ter formalizado regularmente em 2000, sendo premiado pela ilegalidade perpetrada. Isso evidencia a inconstitucionalidade do preceito, por violação à razoabilidade, notadamente porque não há qualquer fundamento apto a justificar que a ilegalidade conduza à ampliação do prazo remanescente e muito menos à abertura de um novo prazo quinquenal. Tal vício, contudo, jamais foi pronunciado pelo STF e tampouco pelo STJ.

Em suma, à luz do sistema do CTN e da jurisprudência predominante, essas são as regras básicas com respeito à decadência do direito de o Fisco formalizar (constituir) o seu crédito:

1.em geral, o prazo quinquenal flui a partir do primeiro dia do exercício seguinte àquele em que poderia ter ocorrido o lançamento (art. 173, I);
2.nos tributos sujeitos alançamento por homologação cujo pagamento ocorreu antecipadamente, a caducidade do direito de a Fazenda lançar a diferença não declarada verifica-se após cinco anos a contar da data do fato imponível (art. 150, § 4º), salvo se ocorrer dolo, fraude ou simulação, hipótese em que se aplicará a regra geral do art. 173, I;
3.caso haja notificação de medida destinada à apuração de crédito, esses prazos serão antecipados ou interrompidos (art. 173, parágrafo único);
4.se o lançamento for anulado por vício formal, começará a fluir um novo prazo decadencial, a partir da data em que se tornar definitiva a decisão anulatória (art. 173, II).
É digno de nota o fato de que os prazos de decadência tributária não se interrompem nas hipóteses de interrupção do prazo prescricional (art. 174, parágrafo único). E tampouco se suspendem quando se verifica a suspensão da exigibilidade do crédito tributário (art. 151), o que impõe ao Fisco o ônus de formalizá-lo mesmo quando o crédito se mostra carente de exigibilidade, sob pena de caducidade do seu direito (STJ, 1ª Seção, AR 2.159, ago. 2007).

Essas considerações também se aplicam às contribuições de seguridade social, haja vista ter o STF pronunciado a inconstitucionalidade do regramento específico veiculado pelo art. 45 da Lei 8.212/91.


(Referência bibliográfica (de acordo com a NBR 6023: 2002/ABNT):
VELLOSO, Andrei Pitten Velloso. Decadência do crédito tributário. Revista de Doutrina da 4ª Região, Porto Alegre, n. 33, dezembro. 2009. Disponível em:

Acesso em: 21 jan. 2011).

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