Cidade de Blumenau, Brasil

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quinta-feira, 12 de maio de 2011

Cortes devem seguir decisão do STF sobre sigilo (artigo de Daniel Müller Martins e José Carlos Cal Garcia Filho)


Após cinco meses do julgamento ocorrido nas últimas sessões de 2011, foi publicado o acórdão do Recurso Extraordinário 389.808, relatado pelo ministro Marco Aurélio, em que o Supremo Tribunal Federal discutiu a possibilidade de a Receita Federal acessar, diretamente, sem autorização judicial, os dados relativos às operações financeiras dos particulares.

Estava em jogo a constitucionalidade do artigo 5º da Lei Complementar 105/2001 que, em síntese, auto­riza a administração tributária a solicitar informações relativas ao sigilo bancário das pessoas naturais e jurídicas.

No caso concreto, tratava-se de fiscalização da Receita Federal, na qual houve encaminhamento de ofício à instituição financeira onde a contribuinte man­tinha conta-corrente, visando ter acesso aos dados e extratos bancários relativos ao período fiscalizado.

Por maioria de votos, o STF entendeu ser indispensável a prévia manifestação do Poder Judiciário para que seja legítimo o acesso da Receita Federal às informações que se encontram protegidas pelo sigilo bancário. E assim o fez em virtude de regra clara e inequívoca, constante do artigo 5º, inciso XII, da Constituição Federal, que prescreve que o sigilo de dados somente pode ser afastado mediante prévia autorização judicial.

Em verdade, embora essa decisão tenha sido a primeira a tratar do tema à luz da LC 105/2001, ela não representa novidade na jurispru­dên­cia da Suprema Corte. Como restou assentado nos votos vencedores, o acórdão está em linha de coerência com o entendimento pacificado do STF a respeito da privação de direitos fun­da­mentais.

Como bem disse o decano da Corte, ministro Celso de Mello, a equação direito ao sigilo — dever de sigilo exige — para que se preserve a necessária relação de harmonia entre uma expressão essencial dos direitos fundamentais reconhecidos em favor da generalidade das pessoas (verdadeira liberdade negativa, que impõe, ao Estado, um claro dever de abstenção), de um lado, e a prerrogativa que inquestionavelmente assiste ao Poder Público de investigar comportamentos de trangressão à ordem jurídica, de outro — que a determinação de quebra de sigilo bancário provenha de ato emanado de órgão do Poder Judiciário, cuja intervenção moderadora na resolução dos litígios, insista-se, revela-se garantia de respeito tanto ao regime das liberdades públicas quanto à supremacia do interesse público.

Encontram-se citados no acórdão diversos precedentes do Pleno e das Turmas do Supremo Tribunal Federal — destaque para o rumoroso caso da quebra de sigilo do "caseiro Francenildo" — demonstrando-se que a Corte jamais divergiu quanto à exigência de manifestação judicial, devidamente fundamentada, em casos como o que se estava a discutir.

Para além da clareza da regra constitucional constante do artigo 5º, inciso XII, que não admite flexibilização, o STF reafirmou a importância do papel desempenhado pelos juízes na garantia dos direitos fundamentais dos cidadãos, porque presumivelmente ocupam posição de terceiros imparciais (terzietá) em relação aos interesses em disputa.

Os efeitos dessa decisão por ora estão limitados ao caso concreto e não vinculam as instâncias inferiores. Como se disse, porém, ela reafirma entendimento pacificado do Supremo Tribunal Federal. Não se pode esquecer, pois, que se trata de decisão do Pleno da mais alta corte do país e como tal deve ser entendida e respeitada. De pouca ou nenhuma validade são os exercícios de futurologia a respeito das próximas decisões do tribunal.

Em termos práticos, e sobretudo jurídicos, o princípio cons­titucional da segurança jurídica aponta para a necessidade de acatamento da decisão do Supremo Tribunal Federal, evitando-se decisões contraditórias e o envio desnecessário de recursos aos tribunais superiores. Afinal, o respeito à juridicidade e aos precedentes é um dos aspectos mais importantes do devido processo legal.

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