Cidade de Blumenau, Brasil

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terça-feira, 7 de agosto de 2012

Quem precisa de polícia no combate à sonegação? (artigo de Raul Haidar)

Na quinta-feira, 2/8, foi feita ampla divulgação de uma tal “operação Orange”, desenvolvida no Distrito Federal pela Receita e pela Polícia Federal, com o objetivo de desenvolver fiscalização sobre empresas do ramo alimentício. Divulgou-se que seriam cumpridos mandados de busca e apreensão até mesmo em residências dos sócios das empresas.


Segundo a notícia, há suspeita de que as empresas são compostas por sócios “laranjas”, tendo causado prejuízos ao erário da ordem de 100 milhões de reais com sonegação de tributos. A ação estaria sendo realizada por 40 policiais federais e 25 auditores fiscais da receita.

Não há a menor dúvida de que o combate à sonegação é importante. Todavia há certo aspectos que chamam nossa atenção no caso, especialmente no que se refere à atuação de agentes policiais.

O artigo 200 do Código Tributário Nacional diz que as autoridades administrativas federais podem requisitar auxílio policial “quando vítimas de embaraço ou desacato...ou quando necessário à efetivação de medida prevista na legislação tributária...” Portanto, a presença da polícia na ação fiscal é exceção e não regra e só se justifica quando houver embaraço ou desacato e em situações muito especiais.

Se a Receita tem meios até mesmo de avaliar o valor sonegado, já tem condições de fazer o lançamento. Mas quando em nota divulgada pela sua assessoria de imprensa declara que há 10 mandados de busca e apreensão a serem cumpridos, registra que o lançamento ainda dependente de provas. Ou seja: se o trabalho ainda está na fase de coleta de provas, não há base legal para lançamento e o valor de 100 milhões não tem fundamento ou se trata de mera adivinhação.

Como se sabe, legalmente policiais não podem arrecadar ou examinar livros ou documentos fiscais e contábeis. No § 1º do artigo 144 , a Constituição diz ser competente a polícia federal para prevenir e reprimir o contrabando e o descaminho, mas isso “sem prejuízo da ação fazendária”, o que significa que, quanto à fiscalização, ela é privativa do fiscal.

A exclusividade do auditor fiscal no lançamento tributário não é apenas uma prerrogativa de função. Todas as atividades de apuração do crédito fiscal e respectivos lançamentos necessitam de conhecimentos técnicos e adequado treinamento, que somente os auditores possuem.

Apesar do elevado nível técnico desses profissionais, muitas vezes ocorrem falhas em seu trabalho, até porque sua formação acadêmica é extremamente eclética. Há auditores formados em filosofia , odontologia, física, engenharia, etc. que, apesar do treinamento, podem cometer enganos em seu trabalho.

Policiais, quer sejam delegados, agentes, escrivães, investigadores , etc., não possuem conhecimento técnico que lhes permita exercer a difícil tarefa da fiscalização tributária. E mesmo que eventualmente algum deles possuir o conhecimento, não possui a atribuição legal que para tanto se exige.

Ademais, quando tais policiais comparecem nas empresas para, ao arrepio da lei, examinar livros e documentos fiscais, geralmente se apresentam em viaturas policiais, cuja presença ostensiva em muitos casos causa desnecessário constrangimento ao contribuinte.

Ora, se não ocorre embaraço ao trabalho fiscal, se os auditores não encontram impedimentos à sua atuação, não há necessidade de acompanhamento policial em diligências administrativas.

Sempre que a fiscalização , seja federal, estadual ou municipal, usa a força policial sem necessidade ou sem mandado judicial, convida a imprensa para acompanhar diligências que deveriam ser realizadas com critério e moderação, ou quando agentes do fisco ou da polícia passam a dar entrevistas e submeter o contribuinte à execração pública, estamos diante de atos abusivos, feitos ao arrepio da lei. Isso não é necessário e muitas vezes coloca em risco a própria legitimidade das diligências.

A fraude que consiste em empresas compostas por “laranjas” deve ser combatida com rigor. Estamos na era da internet, onde quase tudo é fácil. Pois bem: se a Receita fizer (de forma legal) um convênio com o Registro do Comércio, bastaria acompanhar todas as alterações societárias no momento em que estejam em andamento. Verificar a fraude depois de causado o prejuízo ao erário, tem resultados práticos muito discutíveis. Trata-se de fechar a porteira depois que a boiada fugiu. Isso não serve para nada. Nesse ponto assemelha-se a essa necessidade ridícula de colocar nomes que entendem engraçados para rotular o trabalho fiscal. Operação Orange! Pois sim! A Receita faz um trabalho sério e não precisa dessas brincadeiras e nem de polícia para acompanhar seus agentes em suas atividades rotineiras. Os agentes federais talvez sejam mais úteis nas fronteiras e no combate ao narcotráfico.

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